27/01/09

CÉU ENGAIOLADO




No auge de uma adolescência bem sucedida, Leonardo é repentinamente arremetido, durante o período de férias escolares, por um chamamento que o fará tomar uma decisão surpreendente e mudar o rumo de toda a sua vida: entrar para o seminário. Numa altura em que a crise de vocações sacerdotais é um problema premente da Igreja Católica, essa atitude de Leonardo causará alguma estranheza entre seus familiares e amigos, sobretudo por ter sido repentina, mas todos o apoiarão.Com “Céu Engaiolado”, o leitor verá abertas as portas de um seminário, onde poderá entrar e conhecer um pouco desse mundo, desde as principais actividades, modos de funcionamento, sistema de ensino, prefeitos, professores e várias outras informações sobre o seminário de São Paulo, na fictícia cidade de Soterneo.Esse mundo, onde Leonardo se integrará sem grandes problemas, sentindo que tomou o caminho certo na sua vida, é vivido de forma diferente por outros seminaristas que ele encontrará por colegas. Nem todos vivem da mesma forma aquele espaço, cada um deles foi lá parar de forma distinta, alguns não chegarão ao fim do percurso.Com o passar dos dias, tudo vai tomando o seu rumo e a vocação de Leonardo passará por algumas provas, sobretudo a partir do momento em que ele conhece uma pessoa especial, cuja vida também conhecerá alterações abismais. A questão do celibato, é, pois, transversal a todo o romance, ganhando um maior destaque a partir do momento em que se dá esse primeiro encontro entre as duas personagens principais.Outras questões também se colocam ao longo de toda a narrativa, em que, apesar de uma certa imaturidade e desconhecimento por parte dos protagonistas, se lança a semente para um debate mais claro sobre temas como a existência de Deus, a importância do Baptismo, a justiça divina, a Salvação eterna, entre outros.“Céu Engaiolado” é, pois, uma história em cujas páginas coexistem sentimentos múltiplos e se fazem breves reflexões sobre assuntos que apenas na aparência têm uma resposta fácil e esclarecedora, tomando uma outra dimensão quando abordados por dois jovens que pertencem a realidades tão distintas.

20/11/08

Capítulo II

(...)Depois de finalmente terminado todo aquele ritual feminino de embelezamento, Carla levantou-se, apanhou a almofada que o marido lhe tinha atirado e dirigiu-se para o leito। Deitou-se e puxou-o para o pé dela. Estavam agora deitados de lado, virados um para o outro. Hélio passou-lhe os dedos pelos cabelos e, aproximando-se mais, cheirou‑os e beijou-os, enquanto as mãos dela peregrinavam pelos ombros largos e pelas costas musculadas do marido. Os únicos sons que se ouviam eram o da respiração de ambos e o do contacto corporal cada vez mais intenso. A estes, juntava-se repetidamente a melodia terna dos beijos que davam. Naquele momento, pleno de intimidade, esqueceram-se de tudo, entregando-se por inteiro um ao outro, até que, subitamente, Carla parou de o beijar, afastou-lhe as mãos do seu corpo e olhando-o nos olhos, disse com um ar carregado: (...)

10/11/08

Capítulo XXVIII

(...)
Eu nasci no tempo errado.
Eu não nasci p`ra este mundo.
Sou assim um desterrado,
E assim sinto-me imundo.

O ser quem sou deixa-me irado
E o rosto de lágrimas inundo.
Sinto o mundo tão parado
E irrequieto tão lá no fundo.

Manuel, em mais uma noite de clausura, olhava para o seu poema acabado de escrever e relia-o, sentado junto à secretária do seu quarto, com a luz ténue do candeeiro, que ele regulara para estar quase no mínimo, a incidir sobre aquele pedaço de papel com o qual ele compartilhara um pouco mais da sua dor. Estava inclinado sobre o poema, com os cotovelos em cima da mesa e as mãos a tapar as orelhas e ficou naquela posição, inerte, durante mais de dez minutos, relendo várias vezes aquelas palavras que acabavam de sair do cálamo da sua alma.

30/10/08

Capítulo VI

"O dia 13 de Setembro chegara finalmente. Apesar de ter dormido muito pouco durante a noite, devido à ansiedade e a algum nervosismo, Leonardo acordou cedo nesse dia. Continuava, contudo, deitado na cama. Os pensamentos que o ocuparam durante a noite permaneciam ainda a passear pela sua cabeça. Ainda que aquele dia fosse bastante importante para ele e de a sua alegria ser grande por ter finalmente chegado o momento tão esperado, Leonardo sentia um pequeno nervosismo, uma espécie de receio de encarar uma realidade tão diferente daquela que ele sempre vivera.
Olhava para o seu quarto, para as suas coisas à volta, para as suas medalhas e troféus conquistados, orgulhosamente expostos num escaparate, sabendo que nas noites seguintes já ali não estaria. Passaria a dormir num sítio estranho, com gente que ele não conhecia. Deixaria de ouvir a irmã bater levemente na porta, com três toques, o que acontecia sempre que ela, por algum motivo, não conseguia dormir, à espera que ele, lá de dentro, desse sinal que também não estava a dormir. E então ela entrava e ficavam a conversar até que o sono aparecesse. Deixaria de ouvir, de manhã, a mãe a gritar da cozinha, insistindo para que ele acordasse, senão chegaria atrasado às aulas.
Iria ele adaptar-se bem à mudança? Custar-lhe-ia muito ao início, mesmo sendo tão grande a sua vontade? Seria mesmo aquela a opção certa para a sua vida? Naturalmente que todas essas questões já lhe haviam passado pela cabeça desde que ele ponderou entrar para o seminário, mas, à distância, estas pareciam ter uma resposta muito segura, sem hesitações. Agora, quando chegara o dia da verdade, todas aquelas dúvidas ganhavam outra dimensão, o que lhe estava a causar toda aquela inquietação. Nas conversas que costumava ter com o padre Ribeiro depois da missa que ia acolitar, este bem lhe dizia que seria perfeitamente normal que ele se fosse sentir daquela forma à medida que a data de apresentação no seminário se fosse aproximando, e que não se preocupasse nem se atemorizasse muito com isso, já que era uma reacção natural, que acontece a todas as pessoas quando se avizinha uma mudança grande nas suas vidas." (...)